O diferentão das quatro e vinte

Um dos maiores estereótipos que emergem em discussões políticas ou sociais é a imagem do estudante universitário desleixado com a aparência, fumador de maconha e militante da esquerda. Youtubers de extrema direita atacam ferozmente essa “personagem”, enquanto os universitários que se aproximam desse perfil defendem que esse comportamento faz parte naturalmente da fase que estão vivendo. Já me deparei com muitas caras descrentes diante de minha afirmação de que nunca fumei maconha, sobretudo porque fiz um curso das Humanas. Ou seja: generalizações e preconceitos coincidentes em segmentos ideológicos antagônicos.

Nunca fui um jovem a quem pudessem chamar de conservador. Quando adolescente, tive crises religiosas que me fizeram, segundo a visão de alguns, blasfemar, e choquei muitas vezes as pessoas com comportamentos considerados transgressores, mas nunca fumei. Confesso que cheguei a experimentar cigarro uma vez – Alguém nunca? – e minha curiosidade dissipou-se ali como a fumaça que ele produz. Depois disso, nunca mais. Estudei em duas faculdades públicas, mantendo amizades com usuários de cigarro de tabaco e de maconha e, nem por isso, aconteceu, uma única vez que fosse, de eu faltar à aula para fumar enquanto conversava com os amigos, sentado no chão de algum recôndito do campus. Não porque eu fosse “careta” ou medroso, mas porque fumar não era algo que me atraísse. Aliás, sinto incômodo! Tenho rinite, meu nariz entope com frequência, fico p… quando a fumaça de um cigarro entra pelo meu nariz sardento.

Mas, voltando aos preconceitos, gostaria de comentar o que me incomoda. Definitivamente, não é a opinião dos youtubers de direita, pois essa é esperada, mas a de alguns universitários, que se irritam quando alguém faz generalizações sobre comportamentos humanos, “que detestam rótulos” e tal, mas fazem as suas generalizações quando lhes convém. Acham que todo universitário deve fumar maconha, que esse hábito faz tanto parte da vida acadêmica quanto uma produção de um artigo científico. Mais: acham que estudantes de certos cursos, como os da área de Humanas, têm de fumar maconha e se portar de forma pouco convencional. E muitos mesmos acreditam que há cursos com maior número de alunos que gostam de Cannabis do que em outros, como se o hábito fosse decorrência do curso.

Nada contra quem fuma maconha – nem é sobre essa prática que trata este texto –, é uma escolha de cada um, contanto que não o faça como pressão do meio, ou como uma maria-vai-com-as-outras e que não saia pregando que “faz parte”, porque não faz! Pode fazer parte da vida de cada um em particular, mas não é prerrequisito para ser universitário, muito menos para ser um bom universitário. Ainda mais que alunos do ensino médio também fumam e pós-graduados também. Conheci muitos estudantes de graduação que sofreram horrores preocupados em dar conta de todas as tarefas do curso e superaram tudo sem pôr um cigarro de maconha na boca (ou qualquer outra substância para “alívio da pressão”) e também muitos que fumavam demais e mal assistiam às aulas. Para boa parte destes, porém, o simples fato de você dizer que não fuma, que não “curte”, já os leva a tachá-lo de preconceituoso, como se você não pudesse simplesmente não gostar de maconha sem ter preconceito com quem a usa. Até escrever um texto sobre esse assunto, para alguns, torna o autor preconceituoso, como fui chamado numa breve postagem que pus no Facebook sobre isso. Se você diz que nunca se encaixou em certo perfil que acreditam ser generalizado, você é o “santinho”, o “diferentão”. Ou seja: você recebe rótulos dos que dizem detestar rótulos. Ué?! E a individualidade tão defendida não existe?

Há muitas generalizações e equívocos em torno da relação universitário e maconha: além da já comentada de que a erva faz parte da vida de qualquer estudante de nível superior, há também a de que os fumantes são do curso das Humanas, são comunistas, anarquistas e defendem o PT. Só que não!

O que não dá para aceitar mesmo é ver o pessoal afinado com o discurso antipreconceito, bradando contra os “rótulos” e reivindicando respeito desrespeitando quem simplesmente não segue seu estilo de vida porque não quer, porque conscientemente optou por não seguir. Afinal, a vida é cheia de variáveis (fazendo aqui uma ponte com a linha da Linguística que sigo no meu curso de pós-graduação) e cada uma delas tem sua razão de ser.

Jards Nobre, colunista do Diário De Quixadá.

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