Exclusivo: MP-CE pede à justiça extinção da Fundação João Ricardo Silveira por uso ilícito com interesses financeiros

Sede da rádio Liderança em Quixadá, onde atuam os dirigentes da Fundação João Ricardo Silveira, acusada de desvios de finalidade pelo Ministério Público do Ceará, que quer sua extinção.

Tramita na 3ª Vara da Comarca de Quixadá, no Sertão Central, Ação Civil Pública promovida pelo Ministério Público do Ceará, através da promotora Gina Cavalcante Vilasboas, pedindo a extinção da Fundação João Ricardo Silveira, administrada por integrantes da família Silveira, neste município. Veja documentos dos autos do processo no final desta matéria.

Após analisar denúncia feita por Weiber Queiroz Cavalcante, ex-integrante da Fundação, os promotores concluíram que os dirigentes montaram um esquema ilícito envolvendo desvio de finalidade para obter, através da Fundação, lucros financeiros impróprios.

Explicado de maneira simples, o argumento do Ministério Público é que a Fundação João Ricardo Silveira existe no papel como instrumento destinado exclusivamente para execução de serviços de radiodifusão com finalidade educativa e cultural, porém, na prática, é usada para satisfazer interesses econômicos dos seus instituidores, o que caracteriza desvio de finalidade.

O Ministério Público, inclusive, solicitou informações a Agência Nacional de Telecomunicações sobre a regularidade da Fundação João Ricardo Silveira, obtendo o seguinte parecer: “A Estação Transmissora de Radiodifusão Sonora em Frequência Modulada (RDFM), operando na frequência de 105,9 MHz, Rádio Liderança, apresenta irregularidades no conteúdo de sua programação.” O Ministério Público, então, afirma: “Forçoso concluir que a Fundação Educativa João Ricardo Silveira violou as finalidades institucionais para as quais fora criada.” Os promotores pedem à justiça que, em vista das ilicitudes constatadas, declare a extinção da Fundação administrada por integrantes da família Silveira e incorpore seu patrimônio a outra fundação com finalidades sociais semelhantes.

A denúncia do ex-integrante

Se já parece grave desviar a finalidade de uma concessão pública, dada em confiança, para que esta se transforme em meio de ganhar dinheiro de forma ilícita, a denúncia feita ao MP-CE pelo ex-integrante da Fundação, Weiber Queiroz, é ainda mais estarrecedora.

Weiber afirma ao MP-CE que atuou como curador da Fundação João Ricardo Silveira e integrou seus quadros por vários anos e que, ao longo do tempo, percebeu a existência de “diversos desvios de finalidade”. Relata, por exemplo, o que chama de “abandono das funções de caráter educativo e comunitário para abraçar associações empresariais não compatíveis com o conteúdo estatutário, promoção de festas de forró com sentido puramente de lucros e alianças a partidos políticos para se auferir contratos com o poder público.” 

O denunciante vai além e afirma que a concessão pública de radiodifusão seria usada de maneira extorsiva, como “instrumento de barganha”. “Uma vez não obtidos os contratos almejados, as emissoras foram usadas para macular a honra e a dignidade de pessoas de bem”, aponta Weiber, e acrescenta: “A referida fundação se comporta como uma pessoa jurídica voltada a servir a interesses familiares”. 

Em sua carta de renúncia à diretoria da Fundação, Weiber apontou as suas razões: “Sem dúvida alguma a emissora educativa pertencente à Fundação cumpriu inicialmente com a finalidade planejada, porém, há tempos vem desvirtuando as determinações estatutárias, deixou de prestar serviços educativos e comunitários e passou a servir a grupos políticos e empresariais, promovendo bandas de forró, festas, bingo, associou-se ao grupo Liderança de comunicação, e por derradeiro a conveniar-se com partidos políticos e obter retorno financeiro decorrente de contratos com o poder público, e quando não obtidos a emissora distrata e macula a honra de pessoas de bem.”

Weiber explica na carta que tentou corrigir os desvios de finalidade, mas que não conseguiu porque a Fundação é dirigida por “grande número de pessoas de uma mesma família”. Ele também criticou o que chamou de “total ausência de transparência no gerenciamento de sua administração”. 

Processo longo, mas chegando ao fim

As denúncias de Weiber Queiroz, feitas ainda em 2013, foram largamente apuradas pelo Ministério Público do Ceará ao longo dos anos. A investigação envolveu juntada de documentos, contatos com entidades federais, visitas à sede da Rádio Liderança e escuta da defesa, que nega as acusações. A defesa utilizou a realização de divulgação das atividades da intitulada “Caravana do Coração”, feitas pelo médico Ricardo Silveira, como exemplo de que cumpre com suas finalidades sociais. O Ministério Pública não concordou e manteve o pedido de extinção da Fundação.

A denúncia de Weiber Queiroz, ao longo dos anos, foi convertida em procedimento administrativo, Inquérito Civil e, por último, em Ação Civil Pública. Além de Gina Cavalcante, estiveram envolvidos nos diversos procedimentos de apuração os promotores André Clark, Camila Saboya, Caroline Rodrigues Jucá e, já em 2020, Claudio Chaves Arruda.

Em seu último pedido, datado de 19 de maio de 2020, o Ministério Público solicitou ao Poder Judiciário que estipule data para audiência entre os representantes anteriores e atuais da Fundação João Ricardo Silveira e o denunciante Weiber Queiroz.  No dia 25 de maio de 2020, o Juiz Adriano Ribeiro Furtado Barbosa, da 3ª Vara, determinou a realização de audiência de instrução e julgamento.

Se reconhecido o desvio de finalidade e determinada a extinção pedida pelo Ministério Público, a família Silveira perderá a administração de todo o patrimônio da Fundação João Ricardo Silveira.

Desejo de comandar a prefeitura

A família Silveira tem como seu maior expoente político em Quixadá o médico Ricardo Silveira, atual candidato pelo PSD. Desde a campanha de 2012 a família tenta emplacá-lo como prefeito no município. Naquele ano, disputas internas nos setores de oposição deram lugar a João da Sapataria, que acabou recebendo apoio do Doutor Ricardo. Em 2016, o médico conseguiu ser o candidato da oposição, mas foi derrotado por Ilário Marques, atual prefeito. Agora, em 2020, tenta novamente alcançar o controle da prefeitura.

Em consonância com esse desejo evidente, a emissora da Fundação João Ricardo Silveira, além de colocar em destaque a veiculação das atividades políticas do Doutor Ricardo, sempre exaltando seu nome, também veicula propagandas comerciais e se dedica, principalmente, a criticar os adversários políticos da família Silveira.

A seguir confira alguns dos vários documentos dos autos do processo que pede a extinção da Fundação João Ricardo Silveira. Toda a movimentação do processo inteiro pode ser verificada clicando AQUI.

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